terça-feira, 5 de janeiro de 2010

O meio ambiente na boca dos economistas

Amália Safatle
De São Paulo

Para quem acompanha os temas ambientais e econômicos há anos, é um marco toda a vez (não são muitas) que economistas respeitados associam um assunto ao outro. Em geral, a Economia, ou o ensino convencional dela, nunca deu muita bola ao Meio Ambiente, considerando-o um assunto menor. Por sua vez, os estudiosos ou militantes do Meio Ambiente costumavam ter uma birra da Economia, enxergando-a como uma vilã ou não entendendo como poderia servir de instrumento para a conservação.

A sustentabilidade, que em uma de suas definições clássicas baseia-se na busca do ganho triplo - no âmbito econômico, ambiental e social -, veio reunir o que o homem separou. O desenvolvimento só fica de pé, ou seja, só é sustentável, se encontrar o ponto de equilíbrio entre esses três pés.

Assim, é notícia quando, por exemplo, o economista e ex-ministro da Fazenda, Delfim Netto, repercute termos como economia de baixo carbono, associa a energia fóssil ao século XX e defende que o governo e a indústria mudem a orientação para uma produção menos intensiva em carbono, como disse em entrevista concedida à Agência Estado no final de dezembro.

Na verdade trata-se de um mantra repetido insistentemente nos últimos anos pelos economistas que atuam no campo da sustentabilidade, mas até pouco tempo ignorado no discurso de estudiosos, digamos assim, da ala tradicional, que representam o pensamento econômico mainstream (literalmente curso principal, ou corrente em voga).

Quando o mainstream passa a incorporar esse pensamento, meio ambiente e sustentabilidade deixam de ser assuntos "alternativos", e passam à ordem do dia, à escala e à rotina. Tudo indica que finalmente caminhamos para isso, para que, de assunto alternativo, torne-se mainstream. Talvez o fato de esse caminho sem volta, direcionado pelas próprias imposições físicas da natureza, ficar tão evidente tenha feito do fracasso da Cúpula do Clima, a COP-15, algo tão anti-clímax.

Porque esse fracasso não refletiu todo o avanço recente e veloz das discussões e práticas nas empresas, nos governos locais e federais, nas manifestações da sociedade civil organizada, na Academia, na cobertura jornalística. Não que se esperasse um grande acordo, dada a enorme divergência econômica, histórica e política entre países emergentes, pobres e ricos, mas, como se disse, a COP-15 superou as mais pessimistas expectativas e fez aumentar o questionamento sobre qual seria, no lugar da ONU, o fórum ideal de discussões e acordos sobre o clima.

Independente de um acordo mundial, necessário para se estabelecer um patamar radical de redução das emissões de carbono, iniciativas de governos locais, empresariais e organizadas por mercados voluntários pipocam, orquestrados por movimentos espontâneos que podem minimizar o drama climático e ajudar a desenvolver uma "economia do século XXI", expressão que Delfim repete, enquanto o entendimento internacional não acontece.

A BMF&Bovespa lançou recentemente um índice que considera a eficiência em carbono das empresas listadas, ou seja, o quanto conseguem produzir mais emitindo menos.

Claro que um acordo ambicioso no âmbito da ONU aceleraria os negócios, mas, mesmo assim, as tecnologias e os produtos verdes avançam mundo afora: segundo projeção da consultoria Roland Berger, o mercado de energias alternativas e produtos verdes poderá chegar a US$ 4,7 trilhões em 2020.

Escolas de negócios de várias partes do mundo aderiram a um programa da ONU destinado a incentivar a formação para a sustentabilidade, chamado Principles for Responsible Management Education. Com o tempo, o assunto será corrente para os futuros administradores e economistas. A Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, por exemplo, é uma das que aderiu e está lançando uma disciplina eletiva, voltada ao tema, a Formação Integrada para Sustentabilidade (FIS).

O mainstream começa a abraçar a causa, e, a partir daí, ninguém segura mais.


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Amália Safatle é jornalista e fundadora da Página 22, revista mensal sobre sustentabilidade, que tem como proposta interligar os fatos econômicos às questões sociais e ambientais.

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